sábado, 18 de setembro de 2010

AS BICHAS DE OURO PRETO

Photo: Du Trópia

Eu era menino quando ouvia histórias do Beco do Satã. Não sei se o do que me recordo é o que ouvia ou o que eu imaginava a partir do que ouvia, ou do que via, mas o fato é que havia um hiato no passadismo de ouro preto, esse que cultua a morte e a pedra, o mofo e a vela. Depois a janela erótica, um rasgo, uma fresta feita de punheta e lirismo, em que silhuetas de homens de cueca e mulheres de calcinha estamparam os casarões históricos. Depois veio o Ratatá, mais uma vez um inferninho homo(esimpatizantes)erótico, uma opção mais junkie (e também, à luz do lirismo dos loucos e bêbedos, mais belo). De novo a apologia às drogas e ao sexo era uma espécie de grito de estátua de pedra, lança de são jorge de aleijadinho manchando de sangue espesso nossa caretice católica, nosso apego à memória de um tempo que foi muito mais trash do que os babados e afins das mulheres de mau hálito do período colonial fazem deduzir. Exagero? Sim. Disse que neste texto se misturariam memória e desejo, imaginação e poesia? E, algum tempo depois, percebi que nestes fatos aqui descritos (e até nos imaginados, e mesmo nos inventados!) havia uma mesma patota, uns 4 ou 7 malucos de carteirinha a que me habituei chamar de 'As Bichas de Ouro Preto', afeitos ao rock e ao choque (não o elétrico, mas erótico), à festa e à fresta (destaca-se aqui que nem todos eram homossexuais, nem todos eram homens, mas que a ação conjunta colocava-os todos num mesmo saco, o radical de sacanagem, o saco do caso de adão. Eram todos viados!). À minha decendência ouro-pretana eles ensinaram que nem tudo era forjado ao fogo da moral, que éramos feitos também de hiatos, que gozar era tão importante quanto orar. Depois li Ginsberg e entendi-lhes a descendência.

Este parágrafo simboliza um salto no tempo, um hiato dentro do texto (estaria claro por si só?). Olho para nosso eventos anuais, para nosso eventos internos, para as vernissages concorridas por bêbados e trêbados, para os eventos do micro-cosmo do micro-cosmo teatral, para os coquetéis da prefeitura, para a rua direita, (ouro preto é uma cidade sem zona, portanto, serei privado desta citação), para o barroco em que é proibido fumar, para os textos do banheiro do satélite e penso: cadê as bichas de ouro preto? E penso: que pasmaceira! Cadê as bichas de ouro preto? Vou pro jazz e danço, nos festivais leio, penso, canto, mas depois penso: o quê eu faço com o meu tesão? Queremos saber se Tiradentes era bem dotado. Queremos imaginar Marília fazendo sexo anal com Tomás naquela banheira da secretaria de cultura. Cadê as bichas de ouro preto? São donos de jornal, papelaria, professores, pensadores, produtores... Cadê Judith Malina? Cadê Judtihs Malinas? Minha mãe se lembra dela tomando banho pelada no tanque do quintal. Nós quase já não temos cinema, não temos boite, não temos puteiro (desculpe me repetir, mas é um fato). Temos um monte de homossexuais, mas é como se não tivéssemos bichas... cadê?

terça-feira, 7 de setembro de 2010

GAZA


Photo: Naty Torres

Os principais artistas do teatro israelense provocaram uma polêmica em Israel ao assinar um abaixo-assinado defendendo o boicote a um novo teatro construído no assentamento judaico de Ariel, na Cisjordânia, alegando não reconhecerem a legitimidade da colonização dos territórios ocupados.
A direção de cinco principais grupos teatrais israelenses havia feito um acordo para participar de um programa de apresentações para marcar a inauguração da nova sala de espetáculos, gerando o protesto de seus integrantes.
O novo teatro, que será inaugurado em novembro, é a primeira grande sala de espetáculos construída em assentamentos nos territórios ocupados e pode comportar as grandes produções dos principais teatros israelenses.
Os grupos teatrais assinaram a venda dos espetáculos sem consultar os artistas, e grande parte deles se nega, por razões politicas, a cruzar a linha verde (antiga fronteira entre Israel e a Cisjordânia, antes da ocupação israelense, durante a guerra de 1967).
No domingo, o primeiro-ministro de Israel, Binyamin Netanyahu, se envolveu na polêmica e ameaçou cortar o financiamento estatal às companhias envolvidas no boicote.
"Nesse momento em que Israel sofre um campanha internacional de deslegitimação, a última coisa que precisamos é de um boicote que vem de dentro", afirmou Netanyahu.
"Não quero minimizar o direito de cada indivíduo, de cada artista, de ter posições políticas. Eles podem expressar seu ponto de vista, mas nós no governo não podemos financiar boicotes de cidadãos israelenses nem apoiá-los de nenhuma maneira", disse.
CONSCIÊNCIA
Itai Tiran, um dos atores de teatro mais importantes do país, disse ao site de noticias Ynet que se apresentar no assentamento de Ariel 'contradiz a minha consciência e tudo em que acredito'.
"Não vou me apresentar naquela sala de espetáculos e em nenhuma outra que se encontre nos territórios ocupados", afirmou.
Para a dramaturga Savion Librecht, Ariel "não é legítimo". "Aqueles que decidiram ir morar lá (nos assentamentos), se quiserem assistir a espetáculos culturais israelenses, podem se deslocar para alguma cidade dentro de Israel", afirmou a dramaturga.
"Se um número suficiente de artistas assinarem (o abaixo-assinado), as peças não poderão ser apresentadas lá", concluiu.
O músico Dori Parnes disse ao Ynet que "por mim eles terão que apresentar o Conde de Monte Cristo [uma das peças previstas na programação] sem som". "A minha música não será apresentada no assentamento, pois não vou colaborar com o projeto de colonização", disse.
CANALHAS E HIPÓCRITAS
O Conselho de Judeia e Samaria, liderança dos colonos israelenses, declarou que os artistas que assinaram o abaixo-assinado são "canalhas e hipócritas".
Para os colonos, o abaixo-assinado foi escrito por "um punhado de ativistas de esquerda anti-sionistas que atacam maldosamente os melhores filhos do Estado, que os protegem enquanto eles atuam nos palcos".
O deputado Zvulun Orlev, presidente da Comissão de Cultura do Parlamento, anunciou que vai convocar uma reunião especial da comissão para discutir o boicote dos artistas.
"Trata-se de um ato anticultural, que boicota centenas de milhares de cidadãos de Israel, que moram em povoados legítimos em Judeia e Samaria [nome bíblico para a Cisjordânia]", afirmou Orlev, que pertence ao partido de direita Habait Hayehudi.
A ministra da Cultura, Limor Livnat, do partido Likud, condenou a declaração dos artistas.
"Este ato grave cria uma cisão na sociedade israelense, discrimina públicos de acordo com as opiniões políticas dos artistas. Deve-se deixar a discussão política fora da vida cultural e artística", disse a ministra para o site de noticias Walla.
De www.mercadocenico.blogspot.com